quinta-feira, janeiro 25, 2007

Ó CHEFE, ABRA ATRÁS!!


Quando viajamos de autocarro somos todos iguais.
Mercadoria anónima.
Gado empacotado.
Destinos passageiros com hora marcada.
As gentes vestem fatos desmaiados e máscaras especiais de combate suburbano.
É a lei do mais fraco que guia a multidão.
Respiração controlada.
Distancias milimetricamente calculadas.
Os corpos desidratados moldam-se com cuidado às arestas afiadas do ego-sistema envolvente.
A janela é sempre o lugar mais cobiçado.
A vista para o mundo tem um preço inflacionado que nem todos podem pagar.
O conforto dos bancos acolchoados pelo suor e pela gordura dos contribuintes, não chega para todos. Mas como dizia a ilustre portuguesa “As árvores morrem de pé!”…
No autocarro público deixamos de ser eu para sermos nós. Nós todos, todos juntos, muito juntos, juntos demais…
Partilha-se a pobreza, a riqueza, a saúde, a doença... Tudo é património social.
Sabem como é tropeçar por acidente num velho amarrotado pelo tempo? Ou contar os botões de um casaco robusto que aquece outro corpo qualquer? Ou pisar um pé que não me dói? Ou ouvir os pensamentos suados de alguém? Ou vestir a alma remendada de um vagabundo moribundo?
Cada viagem é uma história ilustrada. Mas faz de conta que sou eu que escrevo. Com a minha memória pontual, todos os dias à mesma hora lá estou eu para inventar tudo outra vez.

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